segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Apenas Diga Não


Estavam deitados um ao lado do outro na cama. Ele estava dormindo, ela não conseguia pregar os olhos. Há uma semana não se falavam; comunicavam-se apenas por monossílabas ou olhares. Ela tentava achar a razão para isso, mas fechava os olhos para o real motivo dessa frieza. Já fazia tempo que uma mulher ligava para ele e logo após o fim da ligação ele saia (de madrugada, todas as vezes). Sempre dizia que era trabalho, trabalho, trabalho.
Em um dia ela atendeu o telefonema e ouviu o que causou a pior dor da vida dela. Ele saiu do banho e a viu atendendo seu celular; correu até ela e desligou-o. Perguntou o porquê de ela ter atendido, se ela não tinha mais o que fazer. Depois desse momento, não conversaram mais.
Ele acordou e foi ao banheiro. Quando ela ouviu a descarga, levantou e foi até o mesmo lugar onde ele estava.
– Preciso te perguntar uma coisa... Ela disse, encostando-se à porta.
– Fala. Ele disse, nem sequer olhando para ela.
– Você tem um caso com outra mulher?
– Dá licença! Ele foi saindo do banheiro e a empurrou.
– Por favor, me diga! Eu juro que saio daquela porta e te deixo em paz, para sempre. Ela segurou seu braço. Um braço forte, que suas minúsculas e delicadas mãos não conseguiam agarrar completamente.
– Tenho sim, porque?
– Você ainda me pergunta o porque! Ela não conseguiu se controlar. As lagrimas rolavam de seus olhos sem a mínima cautela.
– Você não faz nada para mim, nada, do que ela faz! Ele estava inquieto. Abria e fechava as portas do guarda roupa e as gavetas da cômoda, andava de um lado para o outro.
Ela sentiu seu chão desabar. Ajoelhou-se no chão. A cabeça estava mais pesada que uma barra de ferro.
– Não... Apenas não! Apenas me diga não... E ela se desmanchava em lágrimas.
Ele se sentou na cama. Colocou as mãos na cabeça, como se estivesse perguntando a si mesmo o que tinha feito.
– Eu dei minha vida para você, minha vida... Como consegue ter a audácia de dizer que não faço nada por você!
Ele levantou e se ajoelhou á frente dela.
– Olha... Ela é apenas diversão... Eu só estava um pouco cansado da rotina e quis mudar. Mas eu percebi que ela começou a se apaixonar por mim e que eu era apaixonado realmente por você...
– Isso não explica nada! Isso não vai mudar o que eu estou sentindo agora! Ela levantou. Cambaleou até o banheiro. Ao chegar à porta, ele a puxou pelo braço.
– Me desculpa... Eu te prometo não fazer mais isso!
Ela empurrou-o. Entrou no banheiro e trancou a porta. Encheu a banheira com água gelada, tirou as roupas e adentrou-a. Jogou todos os sais e o sabão adentro e ficou ali. Lá fora, ele batia na porta e fazia juras desnecessárias e mentirosas.
Fechou os olhos e afundou a cabeça. Ficou deitada no fundo da banheira e mesmo assim ouvia a voz grossa do namorado. De repente, um estrondo.
– O que você esta fazendo, sua louca! Ele puxou-a pelos cabelos.
– Não interessa! Nada mais da minha vida te interessa. E pegue esta aliança, dê para aquela! Ela tirou a aliança prateada e jogou no rosto dele.
– Eu já disse que eu terminei com a outra ontem... Eu já cansei de dizer que eu escolhi você!
– E porque não falou comigo ontem, e nem hoje?
– Eu... – Ele, na verdade, só estava enganando-a. Sabia que a amava, mas nunca disse isso. Só uma única vez, quando quis ter a primeira noite. Fez um teatro digno da Broadway, dizendo para ela que se o amasse de verdade faria tudo o que “o amor” deles tinha direito.
 Ele não queria perder a amante, a que lhe cedia orgias incomensuráveis. Mas não queria perder a namorada, a que lhe ensinou o verdadeiro e mais puro sentido do amor.
Por um segundo um filme de toda a relação deles passou em sua cabeça. O primeiro beijo, quando a pediu em namoro, quando foram morar juntos, as confissões, os momentos de ternura e paixão. Logo após, um filme sobre a amante passou também em sua mente. Só conseguia ver um mar de pecado, de desejo carnal e nada de amor. Ele não conseguia levar nada do relacionamento extraconjugal.
Olhou para a namorada e viu como estava destruída. Saiu correndo, subiu as escadas e foi para o teto do prédio. A brisa estava agradável, mas o céu não estava bonito. Poucas estrelas, a lua com pouco brilho.
Foi andando até a beirada. Olhou para baixo e viu vários carros indo e vindo. Viu as luzes das lojas e as pessoas andando para lá e para cá. Sentiu-se o pior dos homens na face da Terra. Tinha caído na real, ela era a mulher de sua vida... E como conseguiu machuca-la?
Subiu o pequeno degrauzinho da beirada do teto. Abriu os braços. Fechou os olhos.
– Não pule... Por favor! Eu te perdôo. Eu juro que te perdôo, mas, por favor, não pule.
Ele olhou para trás. Era a sua mulher, aquele a qual ele amava. Abriu um largo sorriso.
– Eu te amo... me perdoe! Você é a mulher da minha vida!
– Eu também te amo! Ela foi caminhando até ele. Ambos desmancharam-se em lagrimas.
Quando chegou até ele, deu um abraço fulgurante; cheio de ternura e amor. Ficaram ali, grudados um ao outro. Nenhuma palavra podia ser dita, quebraria todo o encantamento – até mesmo a combinação mais bela de palavras do mundo.
Por um tolo descuido, ele tropeçou no cano que havia depois do degrau do teto. Aquilo o fez cair do abismo do prédio. Automaticamente, ela caiu junto dele, estavam abraçados no momento do tropeço.
– Você pode se salvar... Tente pegar nas grades de alguma dessas sacadas! Mas por favor, não morra comigo! Ele disse, com lagrimas saltando de seus olhos desesperadamente.
– Não! Eu não terei vida sem você!
Foram 80 metros a baixo. E um amor trapaceiro, rude, formoso e intenso, ao fim. Não tinham do que se preocupar, teriam toda uma eternidade para se amarem. O amor que o fizeram tão mal por diversas estações, fez renascer no ultimo momento a importância de que cada um tinha na vida do outro. E não importava o obstáculo que aparecesse, quando duas pessoas são destinadas a serem um... Não há nada que as separe.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Amor Passado

Estavam frente a frente, outra vez. Ela não cabia em si de tanta felicidade, e ao mesmo tempo de tanta tristeza. Ele se sentia bem, de uma maneira que não conseguia explicar. Estavam em baixo da arvore que há um ano atrás ela tinha planejado em seus sonhos encontra-lo. No salão, do outro lado da rua, a musica deles tocava. Ela tinha elegido essa como a musica deles, mas de nada ele sabia. Ele não sabia o quanto foi importante na vida dela, não sabia o quanto ela o amou e o quanto ela sofreu com a distancia. A única coisa que sabia é que ela era linda e que já a conhecia.
Os dois se olhavam de um jeito tão acolhedor, que palavras e toques não eram necessários para dizerem o que sentiam naquele momento. Era a hora da verdade, a hora que ela esperou por um ano ininterrupto, com tanto ardor e com tantas lagrimas.
– Seus olhos são tão lindos! Estar presente outra vez neles era tudo o que eu queria... Há seis meses atrás.
– Porque há seis meses? Ele perguntou e pegou em sua mão.
– Há seis meses atrás eu ainda gostava de você. Mas como não queria mais ficar com esse amor silencioso e platônico, resolvi fazer de tudo para te esquecer.
– Você gostava de mim mesmo?
– Eu te amava... mas a vida me ensinou que você era só um sonho, só mais um sonho. E que esse sonho não iria se realizar.
– Nós não podemos ficar agora né...
– Não. Nem agora, e talvez nunca.
– Porque? Ele se aproximou dela. Ficaram a poucos centímetros de distancia.
– Eu tenho namorado. Ele me ama mais que tudo.
– Ele te ama. Mas e você? Ele se aproximou mais ainda, ficando com os lábios ao pé de seu ouvido.
– Eu... – ela pensou. Ela tinha em sua frente o homem que durante meses acreditou ser o grande amor de sua vida. Podia trair seu atual amor, e perde-lo para sempre, ou então podia deixar que as águas antigas continuassem em seus rios antigos – eu amo ele. Amo ele sim, amo muito. Ele me faz feliz – o coração dela não bateu forte quando disse essas palavras. “O que esta acontecendo comigo? Não posso fazer isso!”, ela se perguntava.
– Eu também tenho uma namorada. Mas eles não precisam saber o que nós vamos fazer daqui por diante – ele afastou o cabelo dela do pescoço, e começou a beijá-lo. Abraçou a com força.
– Eu não quero nada, eu gostei tanto de você e não tive a capacidade de te dizer isso – ele continuava a beijar seu pescoço. Ela não estava se sentindo bem. Ele acariciava todo seu corpo, como se já quisesse fazer isso a tempos.
– Então, todo esse tempo que você me quis... vamos desconta-lo agora!
Ele a encurralou na parede. Começou a beijar seus lábios; um beijo fervoroso que trazia o gosto de um sonho antigo realizado e de um sonho atual destruído. Ela não se mexia, estava intacta; enquanto ele matava a vontade oculta de tê-la. Ele então começou a levantar sua blusa, passar a mão por dentro dela. Ela empurrava-o, mas de nada adiantava. Ele tinha fortes músculos, e cada vez que ela tentava se afastar, mas forte ele a beijava e as caricias tornavam-se mais intensas e agressivas.
– Eu não sabia que você era assim – ela disse ofegante. Estava começando a ficar assustada –. Pare, por favor. Não vamos fazer coisas que depois nós iremos nos arrepender.
Ele não parava. Parecia não ouvir o que ela dizia. Ela estava começando a ficar aturdida. Ele continuava a apertá-la, cada vez com mais entusiasmo e intensidade. Ela sentia seu coração bater mais forte e sua visão escurecer. De repente, ela deitou a cabeça em seu ombro e fechou os olhos. A última coisa que sentiu foi algo embrenhar-se em seu corpo. Não sabia o que era, e agora não havia mais importância. Estava desacordada, mas ele não sabia. Aproveitou-se da situação. A musica parecia estar mais alta, a lua maior, e as estrelas mais brilhantes. Sua visão embaçou. Suas pernas estremeceram. Abraçou-a com mais força.
E como um relâmpago, ela abriu os olhos. Ele sussurrou em seu ouvido três palavras. Três palavras que era o que ela mais queria ouvir há meses atrás, mas que agora não significavam as mesmas coisas. Como ele podia dizer isso a ela, sendo que era a segunda vez que se viam em um ano e oito meses? Ela não conseguia se deixar acreditar que ele sentia o mesmo por ela. Que ele sentiu a mesma angustia, a mesma solidão que ela sentiu. Mas era tarde. Tarde demais para eles tentarem ser feliz um ao lado do outro. Ela já não o amava, e percebeu que o grande homem de sua vida era seu namorado. Ele não faria o que ele fez, naqueles momentos.
Ele continuou abraçado a ela, encostados na parede. Ouviram o barulho de um carro dando a partida e cantando os pneus. Ouviram gritos de pessoas que estavam correndo. De repente, escutaram alguém dizer “Fujam, assalto!”. Fortes estampidos foram ouvidos. As pessoas que estavam no salão saíram para ver. Havia dois jovens caídos na calçada, abraçados um ao outro. Unidos, novamente. E agora, por toda eternidade.

Liberdade

O desejo de ser livre. Olhe esse céu tão azul, esse sol que tudo ilumina, essa brisa sorrateira que vai para onde quer sem prender laços em lugar algum.
Desejo de tornar-me como ela. Ir para o norte, regressar ao sul, viver entre a natureza e não dever nada a ninguém. A vontade de poder sair daqui e ser feliz sem deixar laços. Esquecer de todo o passado e – por um dia – viver a vida sem hora marcada. Sem pessoas conhecidas, lugares conhecidos, planejamentos vindos já de antes.
Pegar seu carro conversível sem ninguém pedir informações de onde estará a ir, andar na estrada com os cabelos ao vento e somente o sol e o ritmo da musica a te guiar. Entrar em cidades jamais vistas. Olhar para os lados e só ver verde, arvores, grama, liberdade. Passar uma semana em um hotel (sozinha) tão, tão longe de seu ponto de partida. Sem ninguém, sem amigos, sem namorado, sem família, sem cachorros – ou só os cachorros, quem sabe.
Uma semana em um hotel fazenda... sem ter contato com ninguém que na sua vida esta – ou estava. Ter a necessidade de conhecer novas pessoas, novos sentimentos, novas relações. Ser livre, leve, solta e descompromissada por um dia. Um único e precioso dia. Inventar outro nome para que depois não te reconheçam (só os que muito te agradaram). Experimentar coisas antes nunca experimentadas. E no final de tudo, não ficar com peso na consciência: “Não era eu, era a fulana. Eu sou a fulana?”. Sim, você é a fulana, ou foi a fulana; por uma semana.
E quando partir, sair quando o sol estiver amanhecendo. Não deixar nada que depois as pessoas consigam te encontrar. Sumir, de repente. Só lembrar dos laços e das experiências vividas nesse dia (ou nessa semana).
Fugir um pouco da realidade, dos problemas, do dia-a-dia, sem dar satisfações, e voltar de repente fingindo que nada aconteceu. Tirar alianças, colares, brincos, experimentar uma nova pessoa dentro de você: seu lado livre. Aquele que se importa apenas com as descobertas. É isso; deixar seu lado livre ser o seu guia por um dia. Só por um dia.

Asas

Estavam sentados em baixo do luar. Ela fez questão de colocar a mesa de jantar no quintal, todo gramado e com arvores por toda volta. Essa era a beleza encantadora da casa de campo, poder sentir a natureza mais perto de ti.
Sentados frente a frente, conversavam sobre a vida e todos que nela estavam. A comida a frente deles não fazia diferença, alias, não tinha a menor importância.
– Eu não sei o que estamos fazendo aqui. Ele disse, perdendo toda a elegância que mantivera até o momento. Era esse o medo dela, ele perder o romantismo quando as coisas estavam fluindo bem. Era o que ele sempre fazia.
– Estávamos tendo bons momentos, perto da natureza, do céu estrelado... ela deu um sorriso, querendo que com ele afastasse as crises de deselegância do companheiro.
– Eu não quero ficar aqui. Esse cheiro, essas arvores, essa comida, essas frescuras... nada me agrada. Ia se levantando da cadeira quando ela segurou sua mão.
– Pouco importa o nosso redor. Eu estou aqui, você esta aqui. É isso que importa e é o que teria de importar.
Ele tirou a mão dela da sua, afastou a cadeira e deitou no chão. Com as mãos atrás da cabeça, ficou olhando para o céu. Fazia expressões de quem estava tentando entender ou procurar a magia que toda aquela noite tentava representar.
Ela se levantou, sentou no colo dele.
– Você não consegue ver a beleza da natureza? Como você não consegue se sentir revigorado com essa lua maravilhosa que esta logo ali acima?
– Eu não consigo me sentir revigorado nem com você no meu colo – ele olhou para ela, que estava com expressão de indignação, e riu –. Estou brincando. Desde pequeno não fui ensinado a gostar de natureza.
Ela se deitou ao lado dele. Começou a olhar as estrelas e pedir para que a ajudasse.
– Meu sonho era jantar desse jeito, e com você. Mas você conseguiu acabar com ele quando estava se tornando concreto.
– Desculpa, mas esse não é meu estilo.
Uma lagrima de desgosto rolou do olho da garota.
– Hoje a gente completa dois anos de namoro. Queria que essa noite fosse meu presente.
– Tenho um presente melhor para ti. Mas já disse, só vou entregá-lo quando a noite terminar.
Ela rolou até o peito dele. Sentia seu cheiro entorpecente. Passava a mão em seus cabelos, seu rosto, sentia o quão lindo e precioso ele era.
– Eu tenho outro presente pra nós. Sussurrou em seu ouvido.
Ele se virou. Ficaram frente a frente.
– Ter você, ter essa natureza entediante ao meu redor... já é um presente.
Os dois riram. Acariciaram a face um do outro. Deram um quente e longo beijo. Seus corações começaram a bater mais rápido. O sangue se tornou chamas, que corriam rapidamente por suas veias. As coisas começaram a acontecer naturalmente. Com os olhos fechados, os toques, os beijos, as sensações, se tornaram mais intensas. Sentiram-se na plenitude do céu. Ganharam asas, percorreram o corpo e o interior de cada um com todo o amor que tinham guardado nesses dois anos. Chegaram às estrelas, foram apresentados para a lua e para o sol. E em um instante, perderam suas asas. Mas ganharam um fulgor especial e novo. Quando abriram os olhos, não acreditaram no que viram. Estavam ali, um em frente ao outro, Adão e Eva, unidos em um só.
Ele mexeu no bolso da calça que estava logo ao lado. Pegou uma caixinha de veludo preta. Ela estava de olhos fechados e a cabeça encostada em seu peito. Ele roçou o veludo em sua orelha. Ela olhou para cima.
– “Cê parece um anjo, só que não tem asas. Oh meu Deus quando asas tiver, passe lá em casa” – ele cantarolou em seu ouvido. Ela olhava para a caixa, que nas mãos dele permanecia, com o olhar tão brilhante quanto um farol – “e ao sair, pras estrelas eu vou te levar. Com ajuda da brisa e do mar, te mostrar onde ir.”
Entregou a caixinha para ela. Cautelosamente ela tirou o laço vermelho que a envolvia.
– “E ao chegar, apresento-lhe a lua e o sol, e no céu vai ter mais um farol...” – ela abriu a caixa. Dentro dela havia duas alianças douradas, com uma pedra que se assemelhava com um diamante. Na tampa interna da caixa, havia um papel escrito “Casa comigo?” – “... que é a luz do teu olhar”.
Ela o abraçou. Gritou a palavra “sim” diversas vezes. A felicidade transbordava de seu coração em forma de lagrimas. Ele sentiu o amor dessas lagrimas, e compartilhou as dele também.
– Eu te amo tanto! Ela gritou.
– Desculpa pelos meus chiliques de antes. Eu estava tentando te colocar para baixo e te surpreender, com esse pedido.
Abraçaram-se. A mesma cena de antes se repetiu: beijaram-se, dessa vez ternamente; ganharam suas asas e percorreram todo corpo um do outro. Dois corpos, dois corações. Tornando-se um só. De uma vez por todas, para todo o sempre.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Você Se Lembra?


A lua estava no alto do céu. Estava em sua fase minguante. Tinha a companhia de suas amigas estrelas, que estavam tão brilhantes quanto a luz do sol. Juntas, em harmonia e puro flamejar, brilhavam e transpareciam o amor de um casal que estavam a caminhar juntos no parque, em meio as arvores e as flores que naquela noite de primavera tinha o frescor da brisa envolvente.
– Você se lembra da primeira vez que nos vimos? Ela perguntou.
– Como se fosse hoje, a poucos minutos, que aquilo aconteceu. Seus olhos me cativaram no primeiro instante. Aquela fogueira, as ondas, o violão, a musica, você... Tudo estava perfeito aquela noite.
Ela riu e ficou vermelha. Ele acariciou seu rosto, com a mesma delicadeza e carinho que fez isso na primeira vez que se beijaram.
– Você lembra daquele setembro? Ele perguntou, ainda acariciando-a.
– Aquele setembro em que me pediu em namoro? Ah sim, lembro toda vez que olho para minha aliança. Você fez suspense, disse que queria dizer uma coisa séria e que talvez me deixasse muito triste. Já fui com o coração na mão... Quando me mostrou a aliança... Nossa! Meu coração nunca havia batido tão descompassado daquela forma!
Ele riu, pegou na mão dela, sentiu a textura de sua mão tão macia e delicada.
– Lembra-se de quando te pedi em noivado?
Ela olhou para o chão. Deu um riso leve, mas cheio de ternura.
– Eu nunca chorei tanto, de felicidade. Você soube, desde sempre como me deixar nervosa e mesmo assim calma. Lembra do nosso casamento? Foi tudo tão perfeito... Sua idéia de relembrar o primeiro encontro surpreendeu não só a mim, mas a todos os convidados.
Ele beijou seu rosto. Passou a mão em seu cabelo, sentiu tão macio que eram seus cachos.
– Quando você engravidou, de nosso primeiro filho... Eu não sabia o que fazer de tanta felicidade. Tinha orgulho de olhar para você e falar para todos: essa é minha mulher, minha vida, minha esposa, meu orgulho, e ela esta gerando um pedaço de mim dentro dela.
Os olhos dela encheram de lagrimas. Ela olhou para lua, apontou para uma estrela.
– Lembra quando eu te dei a noticia do nosso segundo filho? Estávamos em baixo de uma árvore deitados, com nosso primeiro filho no colo, olhando as estrelas. Eu me sentia tão feliz quando você acariciava minha barriga, dizia que eu só te trazia felicidades...
Ele ficou observando as estrelas. Pegou na mão dela outra vez, sem desviar o olhar do céu.
– E quando nossa filhinha nasceu? Nossos garotos ficaram tão felizes, cuidaram dela e até hoje cuidam como se fosse uma bonequinha...
Eles ficaram ali. Em um silencio confortador, com as estrelas dançando sobre suas cabeças e a lua cantando suas musicas felizes sobre o amor.
– Quando fizemos cinqüenta anos de casado... Foi uma alegria tão grande reunir nossos filhos, netos, bisnetos... Ver toda nossa família reunida, feliz, cheia de amor e paz. Ver o que construímos durante todos aqueles anos e ter a certeza que fizemos a coisa certa.
– Você consegue se lembrar de quando nos conhecemos, que você ficou louca ao saber que eu era cinéfilo?
– E que você demorou pra me dizer as três palavras mágicas? Só foi me dizer na primeira vez que fomos a um cinema.
– Você sabe que eu tinha medo de sua reação...
Eles riram. Riram e começaram a dançar, ao som da lua e acompanhando o passo das estrelas.
– Com quantos anos estamos agora? Não me lembro... Ela riu.
– Com oitenta e... cinco?
– Acho que sete.
– Nos conhecemos na década de 40, não?
– Nos casamos em 43... Tivemos nosso primeiro filho em 44, o segundo no começo de 46, a nossa boneca em 50.
Dançavam cada vez mais animados. As estrelas desceram até a Terra e começaram a dançar junto deles. A lua com sua grandeza, não podia descer junto deles. Chamou-os para junto de si, ali podiam dançar e cantar para toda eternidade.
– Sessenta e sete anos juntos. Você acha pouco?
As estrelas começaram a levá-los para o céu. Iam a caminho de lá dançando, todos juntos, se divertindo, com um belo sorriso no rosto.
– É sim, muito pouco para todo o tempo que vamos ter a partir de agora. Aqui, nesse parque, passamos o ultimo momento de nossa vida juntos.
– E agora iremos ficar para sempre juntos. A eternidade esta nos chamando para não deixa-la na solidão. Vamos cantar e dançar, nos amar e viver, mas agora no céu.
– Na eternidade.
E assim que chegaram ao céu, a lua cantou mais forte e com mais entusiasmo. Agora todos estavam felizes e num eterno descanso. “Quando enfim a vida terminar/ E dos sonhos nada mais restar/ Num milagre supremo/ Deus fará no céu te encontrar”.

domingo, 14 de novembro de 2010

Lágrimas de Você

As lagrimas descem queimando meu rosto, carregadas do amor e a angustia por você.
No final fica tudo bem. Prometem que verei você novamente, e assim seja. Não sei se devo confiar nas palavras delas, mas mentir para mim elas nunca mentiram; e suas verdades são a matéria-prima da minha força para continuar agora.
Você sempre prepara armadilhas. Me segura sem tocar, me mantêm aqui sem correntes. Eu nunca quis tanto mergulhar em seu amor e não sentir tua tempestade.
Uma pessoa como você é difícil de se achar, por isso agradeço por ter tido você aqui.


quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Quando o Amor Se Vai


Eram sete horas. O céu estava escurecendo, a cidade parando. O céu estava alaranjado, com tons de violeta. Estava ventando; um vento que anunciava boas novas e refrescava os jovens corações.
Ela caminhava pelos trilhos de um trem abandonado; o cabelo esvoaçava em seu rosto, atrapalhando sua vista. Estava com um vestido casual, era vermelho. Sapatos com salto baixo preto, e a maquiagem leve. Tinha decidido sair de casa, dar uma volta, espairecer as idéias.
De repente, viu um homem vindo em sua direção. Parecia estar caminhando com o mesmo intuito dela. Estava com uma calça preta, camisa branca com as mangas dobradas até o cotovelo. Cabelo preto, bagunçado pelo vento. As mãos nos bolsos, a cabeça baixa; andava chutando as pedras, vendo até onde conseguiriam ir.
Conforme a distancia diminuía, ela ia reconhecendo o rosto daquele homem.
-- O que faz aqui? Ele perguntou, assim que se aproximaram.
-- Esfriando a cabeça. E você?
-- A mesma coisa.
Estavam encabulados, não conseguiam um olhar para o rosto do outro. Depois de alguns segundos em silencio, ele perguntou:
-- Como estão as coisas para você?
-- Cada vez piores. Mas faço o máximo para não ficar mal, ou para não transparecer isso. E você? – Ela procurou olhar nos olhos dele, e percebeu que não tinham mais o brilho que tivera antes.
-- Estão boas. Consegui levar minha vida para frente, mas meu coração não. Incrível como tudo pode ser curado rapidamente, menos o coração. Menos a perda de um grande amor.
-- Venha, vamos sentar ali – ela apontou para um degrau de cimento, que era de uma estação de trem antiga que agora estava totalmente abandonada e depredada.
Sentaram-se, um ao lado do outro. Ficaram olhando os pássaros, as nuvens, sentindo o vento.
-- Conseguiu esquecer aquela garota? Ela perguntou. Ele olhou para ela com um olhar de estranhamento, duvida.
-- Não.
-- Ela te machucou muito, né?
-- Talvez eu tenha machucado ela mais. Só que tenho que continuar minha vida, sem demonstrar dor nem nada. Depois dela, nunca mais tive alguém. Fico em casa, prefiro não sair. Enquanto tudo isso não se acertar, não vou procurar outra pessoa.
-- Realmente você a machucou demais. Mas suas traições não devem ter sido tão doloridas quanto as palavras e o descaso dela.
-- Queria saber se ela encontrou alguém, se esta solteira, e até mesmo se voltaria comigo.
Ela olhou para ele, analisou suas palavras, e depois de algum tempo respondeu:
-- Ahhh... ela não encontrou ninguém. Por coincidência ou não, ela esta igual a você. Não sei se ela voltaria com você, há muitas coisas a serem acertadas ainda.
Ele colocou a cabeça no meio dos joelhos. Ficou assim por um tempo, enquanto ela deitou no chão. Como faltavam algumas telhas bem onde estavam, ela pode olhar o céu e o que acontecia logo ali.
Ele levantou. Ficou de costas pra ela por alguns segundos, depois se virou e veio em sua direção. Ajoelhou-se aos seus pés.
-- Você encontrou alguém? Esta solteira?
Sem levantar a cabeça, respondeu.
-- Não e não.
Ele abriu suas pernas e ficou sobre ela. As mãos apoiadas no chão, os rostos distantes por poucos centímetros.
-- Se eu te disser que eu não vou mais te trair, que minha vida perdeu o sentido sem você, que eu não sou mais ninguém sem o teu olhar; que todo dia que acordo sinto a falta de ter o seu cheiro no meu corpo. Você voltaria pra mim?
-- Se eu te disser que não, você faria o que?
-- Me levantaria e iria embora.
-- E se eu te dissesse que sim, faria o que?
-- Te daria um beijo.
-- E, se por um acaso, eu te disser que te amo mais que tudo, mas não voltaria pra você, o que faria?
-- Te daria um beijo, me levantaria e iria embora.
-- E se eu te desse um beijo, me levantasse, e fosse embora. Você iria me procurar?
-- Penso que sim.
Ela deitou a cabeça de lado. Pensou um pouco, virou a cabeça e olhou no fundo dos olhos dele. Por um instante, tudo o que eles tinham vivido passou em sua mente como um filme.
-- Eu só te darei uma nova chance porque ninguém ficou sabendo de sua traição. Porque ninguém ficou sabendo o porquê de termos terminado. Só por isso.
-- Mas... você não voltaria comigo porque me ama?
-- Voltaria só para ter alguém para ficar nas horas vagas.
Ela viu o olho dele encher de lagrimas. Seu coração ficou tão apertado que ela pensou que iria sumir.
-- Você acha que eu voltaria com você só por isso? Você acha que eu sofreria tanto assim só porque gosto de passar o tempo com você? Você acha que eu fugiria do seu olhar porque não te amo? Você acha?
-- Não acho mais nada.
Ele iria se levantar, mas ela prendeu as mãos dele. Virou ele para o chão, e ficaram do mesmo modo que estavam antes, mas ela em cima.
-- Eu não gosto de você, nem sou apaixonada por você. Eu te amo, te amo, te amo. Sem você nada tem sentido, nada.
Ela deitou a cabeça no peito dele, assim, tirando as mãos do chão. Passaram alguns minutos assim, com ele acariciando seu cabelo.
Com movimentos mútuos, deram um longo e demorado beijo.
Ele virou, ela deitou no chão. Estavam deitados de lado, mas frente a frente. Com movimentos mútuos, deram um longo e demorado beijo. Os sentimentos ressurgiam como uma forte explosão, tornando tudo sem sentido, menos o que viviam.
Um arrepio percorreu todo o corpo da garota quando ele beijou seu pescoço. As coisas começaram a ficar mais sérias, não conseguiam controlar suas ações. As bocas e as mãos percorriam todo o corpo, um do outro, como se procurassem a prova concreta de que haviam se reconciliado, e que se amavam mais do que imaginavam. Em um instante, fecharam os olhos e viveram uma das melhores sensações que já haviam vivido. Tornaram-se um só. Naquele momento não havia mais duas pessoas se amando, logo em frente de uma estação de trem abandonada; havia um corpo só, apenas uma mente. Apenas um coração. Batendo mais forte do que podia, amando mais do que conseguia. Dois corações machucados, que agora se tornavam um só e esqueciam de todas as moléstias que sofreram.
O amor machucou, fez sofrer, fez chorar; fez esquecer o sentido de se viver. Mas quando ele voltou para onde estava, e como estava, fez crescer, fez viver, fez ser feliz um casal que tanto se amava, e que já estava cansado de sofrer em um mundo sem amor.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Cocoon (parte 2)

Quando voltou ao seu lugar, ele estava lendo o jornal. Algo de diferente havia acontecido, mas ela não sabia o que era. Se sentou, onde estava antes, olhou para o rosto dele por um tempo, mas ele não tirava os olhos daquelas folhas amareladas.
-- O que você quer? Ele perguntou, sem desviar o olhar.
-- Sinto muito por tudo.
-- Tempo perdido. Ele abaixou o jornal e se virou para ela.
-- O que foi tempo perdido?
-- Todo o tempo que eu passei longe de você – ele colocou as mãos no rosto dela, acariciando aquela pele morena clara, lisa e macia. Olhou no fundo de seus olhos – Você tem certeza que não quer ficar junto de mim?
-- Tenho. Tenho certeza de que não quero ficar longe de você.
Aquela sensação de liberdade voltara. Um fogo se acendeu em seu peito, parecia que o seu sangue se tornara chamas. Não sentia mais as mãos, as pernas, nada; só sentia o cheiro daquele homem que a conquistara. Ela não queria mais viver de estatísticas do passado; hoje era o dia de mudar tudo o que sabia.
Fechou os olhos e sentiu um leve roçar dos lábios daquele homem. Os dois se abraçaram, passaram toda viagem assim: como se fossem um só.
Ao chegar ao destino esperado, desceram e avistaram poucas pessoas na estação. Já era tarde, em volta de oito horas, tudo estava escuro. Saíram da estação e foram procurar algum lugar onde pudessem passar o resto da noite.
Caminhando de mãos dadas nas ruas escuras de paralelepípedos, iluminados apenas pela luz da lua e de suas estrelas, tudo parecia ser perfeito, como nos filmes em que ela assistia.
De repente viram um vulto. Depois, logo outro.
-- O que é isso? Ela perguntou, abraçando com força e medo seu amado.
-- Acalme-se, não deve ser nada.
De repente, ele parou. Sentiu uma coisa cutucar suas costas.
-- Não se mexa! Me passe tudo o que tens, rápido! Um homem de roupa preta e um chapéu que escondia seu rosto disse isso, encostando a arma nas costas dele.
Outro homem, do mesmo jeito que o outro ladrão, agarrou a moça. Começou a mexer em seus cabelos, cheirar seu cangote. Encostou-a na parede, tirou seu chapéu, e começou a puxar seu vestido.
Seu amante, quando viu essa cena, gritou para que parasse; e num ato impensado, saiu correndo em direção ao ladrão.
-- Não! Um grito ensurdecedor a garota deu.
Um barulho imenso foi ouvido. Um corpo cai no chão.
-- Não me deixe, meu amor, não me deixe! Ela chorava, ajoelhada ao cadáver – Me mate também, por favor, me mate! Não tenho mais razões para continuar aqui! Por favor!
Os ladrões jogaram a arma no chão e saíram correndo, sem levar nada. Ela engatinhou até a arma, e deu um tiro em seu peito. Engatinhou de volta ao seu amado, deitou em seu peito, e proclamou suas ultimas palavras:
-- Vou ser sua sombra – deu uma pausa, respirou e continuou – onde estiver... estarei... atrás.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Better Together

Quando me tocou pela primeira vez
Senti o meu corpo estremecer
Ver teu olhar, tão lindo, em meu olhar
Você me fez viajar

Lembro quando seus lábios tocaram os meus
Se fecho os olhos, sinto novamente o seu cheiro
Tudo aconteceu muito rápido
E agora volto a te procurar, só não sei se quer me encontrar

Tanto tempo se passou
Você mudou, eu também
Mas o que vivemos vai ficar pra sempre.

Andei pensando demais em você
Te ver de novo vai me fazer tão bem
E eu espero te fazer sentir bem, também
Assim como sentíamos antes, assim como éramos antes.

Cocoon (parte 1)

O grande e velho relógio da estação tocava seis horas da tarde em ponto. Ela já estava exausta de toda sua vida vazia e queria mudar; renascer em outro lugar. Estava esperando o seu trem, que chegaria em cerca de  vinte minutos.
Levantou e caminhou até o bebedouro. Ao terminar de beber água, alguém puxou seu braço com força. Ela olhou para cima e avistou um belo rosto que há tempos a importunara.
-- O que quer agora? Ela perguntou, afastando a mão dele de seu braço.
-- Ainda pergunta! Devolva-me o que é meu, sua oportunista!
-- Não tenho nada seu. Nada! – respondeu de modo seco e saiu andando em direção a linha do trem. Já eram 18h09min.
Ele parou e ficou olhando ela ir. Analisou sua silhueta e deu uma leve mordida no lábio inferior. Seguiu o caminho até onde ela estava.
-- Bom dia senhorita! Colocou o chapéu.
-- Bom dia, rapaz.
-- Para onde vossa senhoria esta indo?
-- Para o leste. E o senhor?
-- Aonde você for.
Ela ficou em silencio e olhou para baixo. Analisava o chão e pensava quantas pessoas já não estiveram por ali. Enquanto isso, ele olhava para o rosto da rapariga.
-- Porque as coisas terminaram deste jeito?
-- Elas nem começaram. Respondeu, ainda cabisbaixa.
-- Certo. Vai me dizer que foi apenas uma noite e que não significou nada.
Ela não respondeu. Pensou que o silencio talvez calasse os disparates feitos por ele.
-- Vai ou não?
-- Não. Significou sim alguma coisa, mas não é por isso que vou deixar isso martelando em minha mente.
O trem chegou. Havia poucas pessoas a sua espera. Subiam famílias, jovens, mulheres, homens, crianças e idosos. Todos em busca da felicidade, ou então tentando mantê-la perto de si.
Ela voltou correndo pegar sua mala, que estava perto dos bancos onde estava sentada, e depois entrou no trem. Entrou com o pé direito, respirando fundo, em busca da sua felicidade. Ele entrou atrás dela.
-- Me espere. Vou ser sua sombra, onde estiver estarei atrás!
Ela fingiu que não ouvia. O que havia feito para ter um peso desses nas costas? Porque não entrava na cabeça desse jovem rapaz que ela não era a pessoa certa pra ele?
Sentaram-se no mesmo banco. Ela, do lado da janela; assim podia ver as paisagens, ao invés daquele encosto ao seu lado.
-- Agora vai ter que me ouvir! Não tem escapatória.
-- Pode falar. Vou escutar, não há outra maneira de me livrar de você.
-- Porque sumistes? Me deixou na mão depois daquela noite, me deixou a sua procura. Eu larguei tudo por você sabia? Ontem eu terminei meu noivado e disse que precisava acertar minha vida. E você sabe o que era acertar minha vida? – ele olhou para ela, ela negou com a cabeça – era ter você! Era, no mínimo, encontrar-lhe. Apenas me diga, por favor, suplico-lhe para que diga o que aconteceu. Parecia tão envolvida naquele dia.
-- Acontece que éramos comprometidos. Agimos de má fé. Muito me arrependo disso. Meu relacionamento terminou anteontem, estou indo embora para reconstruir minha vida. Agora me formarei e reencontrarei alguém que realmente me faça feliz.
-- Você não respondeu o que perguntei!
-- Eu te disse, naquela mesma noite, tudo o que você significava pra mim e tudo o que aquilo significou. Você já trocou de namoradas mais do que trocastes de roupa, o que isso me ajudaria a continuar a amar você? Você traiu sua noiva, o que isso significa? Que eu e você somos desavergonhados. Você não é para casar. E o que eu mais quero é isso, passar o resto da minha vida ao lado de uma pessoa que me ame, e que eu ame igualmente.
-- Com você vou ser diferente, eu prometo. Nunca amei tanto alguém assim, como estou te amando. Não consegui tirar-lhe da minha cabeça desde aquele dia.
-- Com licença. Ela levantou e caminhou até o banheiro. Ele levantou atrás, e quando ela ia fechar a porta, ele entrou.
-- O que faz aqui? Saia daqui imediatamente! Ele prendeu os braços dela na parede, de forma que conseguisse olhar no fundo de seus olhos e ela não pudesse reagir.
-- Só saio daqui se você repetir o que me disse naquele dia, bem aqui, no pé do meu ouvido! – ele fez sinal para que ela dissesse aquilo no pé do ouvido dele.
-- Essa noite foi a melhor da minha vida. Você conseguiu me fazer sentir especial, me trouxe sentimentos que nunca havia sentido antes. Me mostrou o que é ser amada, me mostrou o que é amar. Se um dia eu não te procurar, é por não ter condições de olhar nos seus olhos e resistir a te ter. – ela proclamou a frase inteira olhando pra baixo, e ao terminar, olhou para ele – Pronto?
-- Ainda não. Falta isso!
Ela fechou os olhos. Não queria ver nada do que iria acontecer. Ela sentiu as mãos dele descerem das suas mãos até seu pescoço. Ele cheirou seus cabelos, seu pescoço, a gola de seu vestido e sussurrou “Era tudo o que eu precisava sentir agora”. Por um momento ela aguardou um beijo, igual ao que eles tinham dado aquele dia. Lembrou do gosto dos lábios dele, lembrou de como era a sensação de liberdade estar acolhida naqueles braços fortes. Mas ele não a beijou, soltou as mãos dela e saiu discretamente do banheiro.
Ela sentou no vaso sanitário e colocou a cabeça entre os braços. Ficou desapontada, lágrimas involuntárias rolaram de seus olhos. Levantou, molhou o rosto e saiu, tentando não demonstrar a solidão que havia sentido naquele momento.

domingo, 10 de outubro de 2010

Me cativas!

Quando te vi chegar, o Sol já não brilhava
O céu refletia seu lindo tom alaranjado
De fim de tarde, de entardecer.

Seu jeito de andar, de supervisionar
Me atraiu a você como as estrelas ao céu
Meu coração bateu mais forte,
Pensando ter encontrado o que procurava.

Depois de me perder de você
Encontrei-me embaralhada ao teu olhar
Tudo começou de maneira sorrateira
Fazendo-me acreditar que eram peças do acaso.

Encontrei teu olhar perdido em mim
Me senti ofuscada pela timidez
Novamente me embaralhei nesses teus olhos
Maliciosos como teus lábios.

Ver teu sorriso, pra mim, foi o ponto máximo da noite
Mas te ver partir foi tornar tudo isso em palavras.
Novamente o acaso me enganou,
Mas sei que te encontrarei.

Minhas palavras te aprisionam a mim
E teu sorriso me aprisionou  junto a você.
Nossos olhos se encontraram novamente
Mais rápido que imaginas.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A Um Passo da Eternidade

O telefonema pegou-a de surpresa. Atendeu com impaciência, seus olhos presos a um livro de suspense numa noite de ventania. O sábado já estava quase no fim e ela ali, presa aquelas páginas. O som do telefone era uma intromissão, um estorvo. Atendeu a contragosto.
Alô? – não obteve resposta. – Alô? Disse com o tom da voz um pouco alterado.
Oi – uma voz lenta, passiva, com um tom embriagado respondeu.
Quem é? – ela diminuiu o tom da voz, acompanhando o ritmo da outra pessoa.
É o Humbert – ele deu uma pausa – seu Humbert... Seu Humbert que te magoou, que esta a caminho de você... – mais uma pausa.
O silencio se instalou do outro lado da linha. Bettie esperou. Esperou. E nada. Só ouvia a música que a vizinha estava ouvindo, e que coincidentemente também saia da ligação, como se no lugar onde ele estivesse também tocasse a melodia. Cada vez mais ela não o ouvia. Apenas a música e o barulho da recepção do edifício onde Bettie morava.
Humbert! Ela gritou – Aonde está você, meu amor? Me diz aonde você está?!
Olhe... para trás! – ele respondeu balbuciando como se estivesse no leito de morte.
Um estrondo imenso invadiu a sala, rompendo em mil pedaços o silêncio atordoante.
Ela se assustou, e quando olhou para a entrada de seu apartamento, avistou um corpo jogado e uma porta escancarada.
Humbert!
Um grito. Um beijo.
O que aconteceu? – ela perguntou desesperada, ajoelhada perto do corpo.
Promete ficar comigo para sempre? Ele balbuciou. Sua blusa estava repleta de sangue e o rosto suado, bem suado.
Prometo! Eu te amo!
Ele acariciou o rosto dela e repetiu as três ultimas palavras proclamadas pela amada.
Então vem comigo!
Um tiro. Um abraço. Duas almas a caminho da eternidade. Juntas, para sempre.